a primeira vez que eu vi amazônia foi num álbum de figurinhas presente da minha irmã flor que já o enviou com todas as figurinhas completas apenas para eu colar
o álbum vinha do recife onde estudava vinha de longe tão longe quanto de longe eram os animais colados um a um naquelas páginas

mamãe viu a foto do papagaio e se admirou ela sempre quis ter um papagaio-verdadeiro
naquele mês de outubro quando eu fiz cinco anos o mundo me pareceu grande e mais feliz do que as seis cores da minha caixinha de lápis de cor

eu tamém ouví histórias de pais que partiram para trabalhar na estrada belén- brasilia e nunca mais voltaram de irmãos que partiram para abrir picadas na transamazônica e nunca mais se sobe de seus paraderos corria a notícia de que tinham sido pegos pela onça pintada de dentes de marfim igual aos do elefante da áfrica outros diziam que caíram na boca de uma sucuri enorme onde ficaram seis meses barriga adentro

barriga adentro                                                                          barriga adentro
barriga adentro

um dia eu ouvi no radio que o governo estava dando terra para quem fosse ocupar o norte do país e eu perguntei a papai onde ficava o norte e le disse – Na amazônia, minha filha, na amazônia 

naquela noite eu dormi com medo de perder algum irmão para a sucuri

Do livro ARARAS VERMELHAS de Cida Pedrosa 

O livro narra, através de “um longo poema”, uma comovente história de um dos episódios mais marcantes da luta contra a ditatura militar que brutalmente assassinou guerrilheiros e guerrilheiras do Araguaia.

A escritora pernambucana e vereadora do PCdoB de Recife, recebeu o prêmio de melhor livro de poesia de 2022 por sua obra Araras Vermelhas na categoria Literatura. Organizado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA)